sexta-feira, 31 de maio de 2013

"Para mim, era nítido que, todas as vezes que levava Nila e o sr. Wahdati até a casa da velha, a atmosfera no banco de trás ficava tensa e pesada, e eu sabia pelo franzido magoado do cenho de Nila que eles haviam discutido. Lembro que quando meus pais brigavam eles não paravam até uma nítida vitória ser declarada. Era a maneira de eliminar o mal​-estar, chegar a um veredito, não permitir que aquilo vazasse na normalidade do dia seguinte. Não era assim com os Wahdati. As brigas não terminavam, se dissipavam, como uma gota de tinta num copo de água, deixando uma mancha residual que não se desfazia. Não era necessário nenhum ato de acrobacia intelectual para deduzir que a velha não aprovava a união e que Nila sabia disso. Enquanto continuávamos essas conversas, Nila e eu, uma pergunta continuava pululando em minha cabeça. Por que ela teria se casado com o sr. Wahdati? Eu não tinha coragem de perguntar. Tal invasão de privacidade não fazia parte da minha natureza. Só podia inferir que algumas pessoas, principalmente as mulheres, optam pelo casamento — mesmo um casamento infeliz como esse — para fugir de uma infelicidade ainda maior. Um dia, no outono de 1950, Nila me chamou. — Eu quero que você me leve a Shadbagh — disse. Explicou que queria conhecer minha família, ver o lugar onde eu havia nascido. Disse que eu estava servindo suas refeições e dirigindo com ela em Cabul já havia um ano e quase não sabia nada sobre mim. O pedido me deixou confuso, para dizer o mínimo, pois era incomum alguém na posição dela querer viajar aquela distância para conhecer a família de um empregado. Em igual medida, me senti contente por Nila ter se interessado tanto por mim e também apreensivo, pois já previa meu desconforto e, sim, minha vergonha, quando ela visse a pobreza do lugar onde eu havia nascido. " Khaled Hossseini- O Silêncio das Montanhas

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