sexta-feira, 31 de maio de 2013

 "Mas foi a mim que ela procurou. Eu era o único, acredito, incluindo o próprio marido, a quem ela abria sua solidão. Em geral, era ela quem conduzia a conversa, o que era muito bom para mim; eu me sentia feliz só de ser o vaso onde ela despejava suas histórias. Ela me contou, por exemplo, de uma viagem de caça que fizera a Jalalabad com o pai, como fora perseguida por pesadelos durante semanas com o cervo morto de olhos vidrados. Disse que tinha ido com a mãe à França quando era criança, antes da Segunda Guerra Mundial. Para chegar lá, teve de viajar de trem e navio. Descreveu como sentiu o balançar das rodas do trem nas
costelas, que se lembrava bem das cortinas presas em ganchos e das cabines separadas, dos apitos e chiados da locomotiva a vapor. Falou sobre as seis semanas que passara na Índia um ano antes, com o pai, quando ficou muito doente. Eventualmente, quando ela se virava para bater a cinza do cigarro num pires, eu dava uma rápida espiada no esmalte vermelho de suas unhas, no resplendor dourado dos tornozelos depilados, no arco alto do pé e, sempre, nos seios grandes e de formas perfeitas. Havia homens nesta terra, eu me admirava, que tinham tocado naqueles seios e os beijado enquanto faziam amor com ela. O que mais restaria a fazer na vida para alguém que já tivesse feito isso? Para onde poderia ir um homem, depois de ter estado no topo do mundo? Somente com um grande esforço eu conseguia desviar o olhar para um local mais seguro quando ela olhava para mim."
Khaled Hosseini -O  Silêncio das Montanhas

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