sexta-feira, 31 de maio de 2013

"É COMO VER A FOTOGRAFIA de uma personalidade do rádio; elas nunca são do jeito que a gente imaginava quando ouvia a voz no carro. Para começar, ela é velha. Ou envelhecida. Claro que eu sabia disso. Já havia feito as contas e calculado que devia estar perto dos sessenta anos. Mas é difícil conciliar essa mulher esbelta, de cabelos grisalhos, com a garotinha que sempre visualizei, uma menina de três anos, de cabelo escuro ondulado e sobrancelhas longas quase se tocando, como as minhas. E é mais alta do que eu imaginava; percebo isso ainda que ela esteja sentada num banco, perto de um quiosque de sanduíche, olhando ao redor com timidez, como se estivesse perdida. Ela tem ombros estreitos e uma compleição delicada, um rosto agradável, o cabelo bem puxado para trás, preso por uma bandana de crochê. Está usando brincos de jade, jeans desbotado, um suéter comprido salmão e um lenço amarelo no pescoço; sua elegância europeia é informal. No último e​-mail, avisou que usaria o lenço para que eu pudesse reconhecê​-la com mais facilidade. Ela ainda não me viu, e fico algum tempo entre os viajantes empurrando carrinhos de bagagem pelo terminal, os motoristas segurando cartazes com o nome dos clientes. Meu coração está pulando no peito; penso comigo mesma: É ela. Essa é ela. Essa é realmente ela. Logo em seguida, nossos olhares se cruzam, e a expressão dela demonstra um reconhecimento. Faz um aceno. Nós nos encontramos perto do banco. Ela sorri, meus joelhos bambeiam. O sorriso é exatamente igual ao de baba — a não ser pelo intervalo do tamanho de um grão de arroz entre os dentes da frente —, caído para a esquerda, o que a faz franzir o rosto e quase fechar os olhos, e também inclinar um pouco a cabeça. Ela se levanta e olho para as mãos, as juntas nodosas, os dedos recurvados a partir da primeira articulação, os calombos do tamanho de ervilhas no pulso. Sinto uma torção no estômago, deve doer muito.
Nós nos abraçamos, e ela me beija as bochechas. A pele é suave como feltro. Quando nos afastamos, ela me mantém a distância, mãos em meu ombro, examinando meu rosto como se estivesse apreciando uma pintura. Uma umidade recobre seus olhos, que estão animados e felizes. — Desculpe ter chegado tão tarde. — Não tem problema — comenta. — Finalmente nos encontramos! Estou tão contente! — O sotaque francês é mais forte pessoalmente do que ao telefone. — Também estou muito contente — digo. — Como foi a viagem? — Tomei um comprimido, senão não conseguiria dormir. Fico acordada o tempo todo. Porque estou muito feliz e animada. — Ela mantém o olhar fixo em mim e sorri, como se tivesse medo de quebrar o encanto caso desviasse o olhar, até o alto​- falante acima de nós alertar os passageiros que relatem qualquer bagagem abandonada. O rosto dela, então, relaxa um pouco. " Khaled Hosseini- O Silêncio das Montanhas

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