sexta-feira, 31 de maio de 2013

"Por qual outra razão fora tão fácil abrir mão de meu sonho da escola de arte, mal esboçando resistência quando baba me pediu para não ir a Baltimore? Por qual outra razão me separei de Neal, o homem de quem fui noiva alguns anos atrás? Ele era dono de uma pequena empresa de instalação de painéis solares. Tinha um rosto marcado, quadrado, do qual gostei no momento em que o conheci na Abe’s Kabob House, quando tomei seu pedido e ele olhou para mim por cima do cardápio e sorriu. Ele era paciente, companheiro e de gênio bom. Não era verdade o que eu disse a Pari sobre ele. Neal não me trocou por uma mulher mais bonita. Eu sabotei as coisas com ele. Mesmo quando ele prometeu se converter ao Islã, assistir às aulas de persa, eu encontrei outros defeitos nele, outras desculpas. Entrei em pânico, enfim, e corri de volta para os recantos, as fendas e as reentrâncias da vida em minha casa. Ao meu lado, Pari começa a se levantar. Vejo quando desamassa as dobras do vestido e, mais uma vez, me sinto espantada com o milagre de ela estar aqui, a centímetros de mim. — Eu quero mostrar uma coisa a você — digo. Também me levanto e vou até o meu quarto. Uma das peculiaridades de nunca sair de casa é que ninguém limpa o seu quarto nem oferece seus brinquedos em vendas de garagem; ninguém dá as roupas que não servem mais. Sei que, para uma mulher de quase trinta anos, tenho relíquias demais de minha infância jogadas por aí, a maior parte enfurnada num grande baú ao pé da minha cama, cuja tampa agora levanto. Dentro, velhas bonecas, o pônei roxo que veio com uma escova para pentear a crina, os livros de desenho, todos os cartões de aniversário e de Natal que fiz para meus pais na escola com feijões, purpurina e pequenas estrelas brilhantes. Da última vez que nos falamos, Neal e eu, quando acabamos com tudo, ele disse: Eu não posso ficar esperando você, Pari. Não vou ficar esperando você crescer. Fecho a tampa e volto à sala de visita, onde Pari se acomodara no sofá em frente a baba. Sento ao lado dela. " Khaled Hosseini- O Silêncio das Montanhas

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