sexta-feira, 31 de maio de 2013

"Abdullah não lembrava, como se alguma coisa pesasse em cada palavra que falava. Recolhia​-se em longos silêncios, a cara fechada. Não contava mais histórias, nunca mais contou uma história desde que voltara de Cabul com Abdullah. Talvez, pensava Abdullah, o pai tivesse vendido também sua musa aos Wahdati. Ausente. Desaparecida. Sem deixar vestígio. Sem explicação. Nada a não ser as palavras de Parwana: Tinha de ser ela. Desculpe, Abdullah. Tinha de ser ela. O dedo cortado, para salvar a mão. Ajoelhou​-se no chão atrás do moinho, ao pé da esquálida torre de pedra. Tirou as luvas e cavou a terra. Pensou nas sobrancelhas pesadas da irmã, na testa ampla e redonda, no sorriso de dentes separados. Ouviu na cabeça o titilar de sua risada rolando pela casa, como antes. Pensou no tumulto que irrompeu quando eles voltaram do bazar. Pari estava em pânico. Gritava. Tio Nabi saiu com ela rapidamente. Abdullah escavou a terra até os dedos tocarem num metal. Remexeu abaixo da superfície e retirou uma caixa de chá do buraco. Raspou a sujeira gelada da tampa. Havia algum tempo ele vinha pensando muito na história que o pai havia contado na noite anterior à viagem a Cabul, do velho camponês Baba Ayub e o dev. Abdullah estava em um lugar onde Pari costumava ficar, a ausência dela era como um cheiro saindo da terra debaixo dos pés. As pernas fraquejaram, o coração desabou sobre si mesmo, ele ansiava por um gole da poção mágica que o dev dera a Baba Ayub, para poder esquecer. " Khaleb Hosseini - O Silêncio das Montanhas

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