sábado, 25 de maio de 2013

" Também o humor constitui uma arma da alma na luta por sua autopreservação. Afinal é sabido que dificilmente haverá algo na existência humana tão apto como o humor para criar distância e permitir que a pessoa passe por cima da situação, mesmo que somente por alguns segundos.   Um amigo e colega com quem trabalhei lado a lado, por semanas a fio, no local da construção, foi por mim adestrado na prática do humor: propus-lhe o compromisso mútuo de inventarmos ao menos uma piada por dia, mais especialmente uma ocorrência que poderia ter lugar após a nossa libertação e volta para casa. Ele era cirurgião, tendo sido assistente de uma seção de cirurgia de um hospital. Assim, por exemplo, tentei fazê-lo sorrir, certa vez, descrevendo a dificuldade que ele teria, após a volta para casa e para o antigo campo de atividades, em perder os hábitos adquiridos no campo de concentração. Diga-se de antemão que, quando o chefe da obra se aproximava do local de nosso trabalho, para inspeção, o supervisor procurava acelerar o ritmo com o habitual "mexam-se, mexam-se!" O que contei a meu companheiro foi o seguinte: "Quando você estiver novamente na sala de
operação realizando uma demorada cirurgia de estômago, o atendente da sala de operação vai entrar correndo e dizer `mexam-se, mexam-se', para avisar que o chefe está  chegando." - Muitas vezes os próprios companheiros inventavam esse tipo de situação engraçada no futuro. Assim prediziam, por exemplo, que quando fossem convidados para um jantar em sociedade, poderia suceder que, distraídos, quando fosse servida a sopa, pediriam à senhora da casa - assim como pediam ao Capo no intervalo do meio-dia - que ela lhes desse sopa "bem do fundo", para pescar algumas ervilhas ou meia batata.   A vontade de humor - a tentativa de enxergar as coisas numa perspectiva engraçada - constitui um truque útil para a arte de viver. A possibilidade de optar por viver a vida como uma arte, mesmo em pleno campo de concentração, é dada pelo fato de a vida ali ser muito rica em contrastes. E efeitos contrastantes, por sua vez, pressupõem certa relatividade de todo sofrimento. Em sentido figurado, se poderia dizer que o sofrimento do ser humano é como algo em estado gasoso. Assim como determinada quantidade de gás preenche um espaço oco sempre de modo uniforme e integral, não importando as dimensões desse espaço, o sofrimento ocupa toda a alma da pessoa humana, o consciente humano, seja grande ou pequeno este sofrimento. " Viktor E Frankl- Um Psicólogo no  Campo de Concentração

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