sábado, 25 de maio de 2013

"Na psicologia do campo de concentração, é precisamente a vida ali imposta, e que constitui um ambiente social todo peculiar, que determina, ao que parece, o comportamento da pessoa. Com razão se poderão levantar objeções e fazer várias perguntas. Onde fica a liberdade humana? Não haveria ali um mínimo de liberdade interior (geistg) no comportamento, na atitude frente às condições ambientais ali encontradas? Será que a pessoa nada mais é que um resultado da sua constituição física, da sua disposição caracterológica e da sua situação social? E, mais particularmente, será que as reações anímicas da pessoa a esse ambiente socialmente condicionado do campo de concentração estariam de fato evidenciando que ela nem pode fugir às influências desta forma de existência às quais foi submetida à força? Precisa ela necessariamente sucumbir a essas influências? Será que ela não pode reagir de outro modo, "por força das circunstâncias", por causa das condições de vida reinantes no campo de concentração?   Podemos dar resposta a esta pergunta tanto baseados na experiência como em caráter fundamental. A experiência da vida no campo de concentração mostrou-me que a pessoa pode muito bem agir "fora do esquema". Haveria suficientes exemplos, muitos deles heroicos, que demonstraram ser possível superar a apatia e reprimir a irritação; e continua existindo, portanto, um resquício de liberdade do espírito humano, de atitude livre do eu frente ao meio ambiente, mesmo nessa situação de coação aparentemente absoluta, tanto exterior como interior. Quem dos que passaram pelo campo de concentração não saberia falar daquelas figuras humanas que caminhavam pela área de formatura dos prisioneiros, ou de barracão em barracão, dando aqui uma palavra de carinho, entregando ali a última lasca de pão? E mesmo que tenham sido poucos, não deixam de constituir prova de que no campo de concentração se pode privar a pessoa de tudo, menos da liberdade última de assumir uma atitude alternativa frente às condições dadas. E havia outra alternativa! A cada dia, a cada hora no campo de concentração havia milhares de oportunidades de concretizar esta decisão interior, uma decisão da pessoa contra ou a favor da
sujeição aos poderes do ambiente que ameaçavam privá-la daquilo que é a sua característica mais intrínseca - sua liberdade - e que a induzem, com a renúncia à liberdade e à dignidade, a virar mero joguete e objeto das condições externas, deixando-se por elas cunhar um prisioneiro "típico" do campo de concentração.   Deste último ponto de vista, também a reação anímica dos internados nos campos de concentração, em última análise, somente pode ser interpretada como algo mais que mera expressão de certas condições físicas anímicas e sociais - por mais que todas elas, seja a falta de calorias, seja a deficiência de sono, sejam os mais diversos "complexos" anímicos, pareçam sugerir que a decadência da pessoa esteja vinculada à lei normativa (Ge setzm. Éssigkeit ) de uma psique típica do campo de concentração. Aquilo que sucede interiormente com a pessoa, aquilo em que o campo de concentração parece "transformá-la", revela ser o resultado de uma decisão interior. Em princípio, portanto, toda pessoa, mesmo sob aquelas circunstâncias, pode decidir de alguma maneira no que ela acabará dando, em sentido espiritual: um típico prisioneiro de campo de concentração, ou então uma pessoa humana, que também ali permanece sendo ser humano e conserva a sua dignidade" Viktor E. Frankl - Um Psicólogo no Campo de Concentração..

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