sexta-feira, 31 de maio de 2013

"Agradeço. O dev arreganhou os dentes. Posso perguntar que mal cometi contra você para desejar minha morte? — Você levou o meu filho mais novo — respondeu Baba Ayub. — Ele era a coisa mais preciosa do mundo para mim. O dev grunhiu e levou um dedo ao queixo. Eu já tirei muitos filhos de muitos pais, falou. Baba Ayub sacou a foice, com raiva. — Então, eu vou me vingar por eles também. Devo dizer que sua coragem me desperta uma onda de admiração. — Você não sabe nada de coragem — disse Baba Ayub. — Para ter coragem, é preciso haver algo em risco. Eu vim aqui sem nada a perder. Você tem sua vida a perder, disse o dev. — Você já tirou isso de mim. O dev rosnou outra vez e examinou Baba Ayub, pensativo. Depois de um tempo, falou: Muito bem, então. Vou aceitar o seu desafio. Mas antes vou pedir que me acompanhe. — Seja rápido — disse Baba Ayub. — Eu estou sem paciência. Mas o dev já se encaminhava a um corredor gigantesco, e Baba Ayub não teve escolha, a não ser segui​-lo. Acompanhou o dev por um labirinto de corredores, com tetos que quase roçavam as nuvens, todos apoiados em enormes colunas. Passaram por muitas escadas e aposentos, grandes o suficiente para conter toda Maidan Sabz. Andaram dessa maneira até que afinal o dev conduziu Baba Ayub a um salão enorme, com uma cortina na parede do fundo. Chegue mais perto, gesticulou. Baba Ayub ficou ao lado do dev. O dev abriu as cortinas. Atrás havia uma janela de vidro. Pela janela, Baba Ayub viu um imenso jardim. Fileiras de ciprestes rodeavam o jardim, com canteiros cheios de flores de todas as cores. Havia piscinas feitas de azulejos azuis, terraços de mármore, fontes de água rumorejante à sombra de árvores de romã. Nem em três vidas Baba Ayub poderia ter imaginado um lugar tão lindo. Mas o que realmente fez com que caísse de joelhos foi a imagem de crianças correndo e brincando felizes pelo jardim. Elas corriam umas atrás das outras pelos caminhos e ao redor das árvores. Brincavam de esconde​-esconde atrás das sebes. O olhar de Baba Ayub procurou entre as crianças e, afinal, achou o que estava procurando. Lá estava ele! Seu filho, Qais, vivo, e mais do que bem. Tinha
aumentado em altura, e o cabelo estava mais longo do que Baba Ayub recordava. Usava uma linda camisa branca por cima de calças bonitas. Ria com alegria correndo atrás de dois companheiros. — Qais — murmurou Baba Ayub, a respiração embaçando o vidro. Começou a gritar o nome do filho. Ele não pode ouvir você, disse o dev. Nem ver." Khaled Hosseini- O   Silêncio das Montanhas

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