sexta-feira, 24 de maio de 2013

"Olho para cima e para os lados para ver as árvores. Tento ouvir a sua silenciosa pregação. Se pregam é porque pensam. Mas seus pensamentos são diferentes dos nossos. Elas pensam da mesma forma como produzem brotos e flores. Não pensam
pensamentos da cabeça, como nós. As árvores não têm cabeça. Não precisam ter cabeça. Elas pensam com o corpo: raízes, tronco, galhos, folhas, flores, frutos. Pensam sempre os pensamentos que devem ser pensados, isto é, pensamentos que têm a ver com a vida. Agora, depois da chuva, as tipuanas e outras árvores estão cobertas de brotos novos. Os brotos novos são seus pensamentos alegres, pensamentos que as árvores devem ter, quando a primavera se aproxima. Os ipês têm outros pensamentos. Eles não são iguais às tipuanas. Estão floridos. Faz duas semanas, eram os ipês-amarelos. Agora, os ipês-rosas e os ipês-brancos. Floriram não por felicidade mas por medo. Floriram por causa da seca. Floriram por medo de morrer e trataram de ejacular sementes para que, no evento de sua morte, suas sementes estivessem espalhadas pelo mundo. Os ciprestes italianos têm fantasias teológicas: afinam-se e querem tocar os céus. Os chapéus-de-sol - que alguns chamam de amendoeiras -, ao contrário, são seres desse mundo. Estendem seus galhos na horizontal. Os paus-ferro, livres de cascas velhas enrugadas, exibem uma pele
lisa e branca onde pessoas malvadas gravam, a canivete, seus nomes. Passo neles a minha mão porque é gostoso sentir sua lisura."  Rubem Alves- O Amor que Acende a Lua

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