sexta-feira, 24 de maio de 2013

"O relógio é o tempo do dever: corpo engaiolado. Mas as crianças só reconhecem, como marcadores do seu tempo, os seus próprios corpos. As crianças não usam relógios para marcar tempo; usam relógios como brinquedos. Brinquedo é o tempo do prazer: corpo com asas. Que maravilhosa transformação: usar a máquina medidora do tempo para subverter o tempo. Criança é kairós
brincando com o chronos, como se ele fosse bolhas de sabão. O ano chega ao fim. Ficou velho. Chronos faz as somas e me diz que eu também fiquei mais velho. Faço as subtrações e percebo que me resta cada vez menos tempo. Fico triste: saudade antes da hora. A Raquel, quando tinha três anos, me acordou para saber se quando eu morresse eu iria ficar triste! Lembro-me do verso da Cecília, para a avó:    "Tu eras uma ausência que se demorava, uma despedida pronta a cumprir-se".
Rubem Alves- O Amor que Acende a Lua

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