sábado, 25 de maio de 2013

"O que dói
 " A apatia e a insensibilidade emocional, o desleixo interior e a indiferença - tudo isso características do que designamos de segunda fase dentro das reações anímicas do recluso no campo de concentração - muito cedo também tornam a vítima insensível aos espancamentos diários e em que se cada hora. Esta ausência de sensibilidade constitui uma couraça sumamente necessária da qual se reveste em tempo a alma dos prisioneiros.   No campo se é espancado pelas razões mais insignificantes, ou mesmo sem razão alguma. Por exemplo: no local da obra está sendo distribuída a "merenda". Colocamo-nos em fila. Aquele que se encontrava atrás de mim deve ter se colocado talvez um palmo fora do alinhamento, o que não deve ter agradado ao guarda SS, talvez por um capricho de simetria ótica, embora do ponto de vista disciplinar isto fosse completamente irrelevante e supérfluo - afinal de contas, estávamos num terreno acidentado e ainda não nivelado. Eu, porém, não podia ter a menor ideia do que ocorria atrás de mim na fila, nem do que se passava na mente do guarda. De repente senti dois violentos golpes na cabeça. Só então me dei conta de que o guarda estava parado a meu lado e tinha usado o cassete.   A dor física causada por golpes não é o mais importante por sinal, não só para nós, prisioneiros adultos, mas também para crianças que recebem castigo físico! A dor psicológica, a revolta pela injustiça ante a falta de qualquer razão é o que mais dói numa hora dessas. Assim é compreensível que um golpe que nem chega a acertar eventualmente pode doer até muito mais. Exemplo: certa vez estive trabalhando numa estrada de ferro, em plena tempestade de neve. A tempestade seria razão suficiente para interromper o trabalho; e para não sentir muito frio, aplico todo o ímpeto em "entupir" com pedras os espaços debaixo dos trilhos. Paro por um momento, a fim de tomar fôlego, e me apoio na ferramenta. Por infelicidade, no mesmo instante o guarda se vira em minha direção e pensa naturalmente que estou vadiando."    Victor E. Frankl- Um Psicólogo no Campo de Concentração

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